Olá Netos Cibernéticos!
A Velha foi ver a montagem “O
Filho Eterno” da Cia. Atores de Laura.
A notícia
que seu primeiro filho em breve estará em seus braços deixa a personagem desta
montagem extremamente entusiasmada. O desejo de se tornar pai será
concretizado. É assim que se inicia o monólogo “O Filho Eterno”, da Cia. Atores
de Laura, uma adaptação, feita por Bruno Lara Resende, do livro homônimo de Cristovão
Tezza.
Na sala de
espera do hospital o pai imagina como será o seu filho, sua relação com ele no
futuro, seus desejos e expectativas em tudo que esta criança se tornará. Ao ver
o médico, ele pergunta se está tudo bem com a criança e com a mãe, sem dúvida
alguma da resposta positiva. O doutor confirma que ambos passam bem,
mas que o filho é ‘mongolóide’, termo utilizado nos anos 80 para definir os
portadores da Síndrome de Down.
Em poucos
segundos o pai, que antes não sabia direito como lidar com tanta emoção e
orgulho por ter um sucessor genético, agora se desnorteia com a notícia que seu
filho é Down e com a imensidão de emoções contraditórias. A partir daí
caminhamos com o pai por todos os sentimentos possíveis, desde o desejo de ver
o filho morto, causando-o imensa felicidade com esta idéia, passando pela a vergonha da criança por ser Down, pela aceitação do filho, as dificuldades inúmeras de se criar uma criança especial e
finalmente chegando à descoberta e valorização das pequenas vitórias da
criança.
Charles
Fricks interpreta este pai. É ele o responsável por nos levar a um sobe e desce
de sentimentos por aproximadamente 1h30min. O tempo passou sem que a Velha percebesse, com exceção de um momento onde as ações da personagem principal se tornam um pouco repetitivas, ele vai e volta para o canto esquerdo frontal do palco diversas vezes, no mesmo sofrimento de não aceitação, e isso deixou a Velha um pouco aborrecida, mas em seguida a montagem retoma seu rumo e tudo volta a estar em sua mais perfeita harmonia. “O Filho Eterno” muitas vezes nos
assusta, pois desmascara os presentes deixando sair em palavras o que muitas
vezes ficam apenas em nossos pensamentos. Durante um longo período da montagem
este pai renega seu filho e diz coisas monstruosas, como “crianças com down
são feias, baixinhas, como ogros de boca grande”. Poderia até ser
engraçado, se não fosse trágico... Fricks consegue fazer nós, espectadores,
sentirmos vergonha de ter um filho down, como sua personagem sente. Ele também
é responsável por aos poucos, junto com sua personagem, nos desvelar o quão
prazeroso pode ser estar ao lado de seu filho em cada nova descoberta: os
primeiros passos; a primeira palavra que a criança emiti, mesmo sendo algo
inesperado que nos leva a deliciosas risadas; os primeiros rabiscos; e a beleza
de perceber o mundo como o down percebe, com sentimentos tão verdadeiros.
Mesmo
estando sozinho em cena Fricks nos faz ver, ao seu lado, o médico, a esposa, o
motorista do carro que o azucrina, e principalmente seu filho em diversos
momentos da vida, em suas diversas alturas. Vemos o filho agarrado em suas
pernas, e não vemos como algo abstrato, como algo que não está ali, vemos a
criança em sua totalidade, com altura, peso, cor e sorriso. Sem dúvida alguma
Charles Fricks nos dá uma aula de corporeidade, interpretação e principalmente
de como utilizar a imaginação a seu favor.
Em uma
montagem onde não se utilizam cenários elaborados e realistas a imaginação é o
que preenche as lacunas deste espaço vazio. Quanto menos o espaço oferece
visualmente ao espectador, mais a imaginação do mesmo é trabalhada e excitada. Fricks
faz com que o público acredite que com apenas um virar de pernas para a sua direita, com uma leve curvatura na mesma, o seu filho esteja agarrado em suas
pernas e assim ele obtém o que raramente a Velha vê nas montagens cariocas: uma
conexão da sua imaginação, transformada em ação, com a imaginação do público,
que está disposto a jogar este jogo imaginário.
Peter Brook,
em “A Porta Aberta” já diz que “as principais tarefas do ator são: traduzir
suas imagens mentais em ações físicas/vocais; criar uma “vida paralela” e ser
convincente na execução das ações mais simples. Portanto, para que consiga
materializar suas idéias inventadas, ele precisa ultrapassar a mera imitação e
ter um objetivo claro e definido” e isto é algo que vimos claramente nesta
montagem dos Atores de Laura.
“O Filho Eterno” é um exemplo do poder da imaginação
do ator quando bem trabalhada. Fazer com que um público acredite nas ações do
ator no palco vai além de apenas imaginar e imitar o que se imagina. Para
convencer o espectador, mesmo nas ações mais simples, deve-se materializar a
idéia, como diz Brook, “em carne, sangue e realidade emocional: tem que ir
além da imitação, para que a vida inventada seja também uma vida paralela, que
não se possa distinguir da realidade em nível algum”.
Esta
montagem é a prova do quão importante é a imaginação no trabalho do ator. Roberto
Mallet diz que “a imaginação do ator tem que ser uma imaginação que se
encarna”, e ele tem plena razão nisso, pois Fricks nos mostra que uma
imaginação em cena não pode ser apenas mental, mas tem a obrigação de envolver todo
o corpo e os cinco sentidos humanos, para somente assim fazer ligação com o
público.
Tudo isso só
é possível porque temos um excelente ator em cena, Charles Fricks, dirigido
pelo ótimo Daniel Herz, em uma adaptação sensacional de Bruno Lara Rezende,
unidos à uma bela escolha de figurino de Marcelo Pies, à iluminação de Aurélio
de Simões e direção musical de Lucas Marcier. Cada um faz seu trabalho de forma
fantástica e é compreensível o porque Fricks no final da apresentação diz ‘nós
somos os Atores de Laura’ mesmo ele estando sozinho em cena, pois sem o
trabalho de toda essa equipe não seria possível uma montagem tão magistral.
Impossível
não derramar lágrimas em uma montagem onde o ator se multiplica, a história é
uma lição de vida e tudo se encaixa perfeitamente. A montagem está com três indicações ao Prêmio Shell 2011: Melhor Ator, Iluminação e Direção de Movimento. Todos os Netos Cibernéticos
estão obrigados à prestigiarem uma das melhores montagens que o Rio de Janeiro
tem neste ano de 2011.
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Informações sobre a montagem:
O FILHO ETERNO
Texto: Cristovão Tezza
Adaptação: Bruno Lara Rezende
Direção: Daniel Herz
Elenco: Charles Fricks
Onde: Teatro Leblon
Quando: até 26 de outubro de 2011 / terças e quartas, 21h
Devido ao sucesso, o espetáculo teve sua temporada prolongada até 14 de dezembro de 2011, terças e quartas, 21h.
Quanto: R$ 50,00.
Quando: até 26 de outubro de 2011 / terças e quartas, 21h
Devido ao sucesso, o espetáculo teve sua temporada prolongada até 14 de dezembro de 2011, terças e quartas, 21h.
Quanto: R$ 50,00.
Onde: Teatro
Leblon
Quando: até
25 de fevereiro de 2012 / sextas e sábados, 18h30.
Quanto: R$
50,00
Que Dionísio
ilumine o caminho dos que precisam!
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